UNO Agosto 2013

Empresas, desporto e cultura

9_2400 milhões de pessoas. Na Ásia, na Europa, nas Américas, no Médio Oriente, colados aos televisores ao mesmo tempo, em fusos horários diferentes mas com um único objectivo: assistir na televisão ao Barcelona-Real Madrid que decidia o título de campeão espanhol.

400 milhões de pessoas é um número impressionante e ninguém se pode admirar que muitas marcas globais tenham feito as suas aparições. Havia a habitual publicidade nas camisolas dos jogadores, à Bwin ou à Qatar Foudation, mas também anúncios estáticos no estádio, desde a Turkish Airlines nas bancadas, à portuguesa Galp em pequenos placards junto às balizas de Casillas e Valdez. E claro, em cada canal de televisão por esse mundo fora, centenas de anúncios foram vendidos a preços elevados, para passar antes, durante e depois do jogo.

400 milhões de pessoas assistiram na televisão ao Barcelona-Real Madrid. É um palco impressionante que muitas empresas aproveitaram para promover as suas marcas

As grandes marcas não podem perder oportunidades destas para comunicarem com o seu público. E isto não se passa só com o futebol. Logo no dia seguinte, durante o Grande Prémio de Fórmula 1 do Bahrein, mais marcas apareciam. Entre muitas outras, a Pirelli, a Red Bull, a Vodafone nos carros da McLaren e o Santander nos da Ferrari, aproveitavam aquela hora e meia para relembrarem quem são.

Os eventos desportivos –o futebol, a Fórmula 1, o ténis, o golfe, o ciclismo, o basquetebol americano, e mesmo os Jogos Olímpicos– são hoje valiosos palcos para marcas internacionais de grande ambição. Seja durante os próprios eventos, seja indirectamente através das celebridades, que publicitam também elas muitos produtos. De marcas desportivas, como a Nike ou a Adidas, mas também de não desportivas. Em Portugal, o Banco Espírito Santo tem uma campanha permanente com Cristiano Ronaldo a incentivar depósitos a prazo; e em Espanha, 9Leonel Messi promoveu há uns tempos as batatas fritas Lays.

Os exemplos multiplicam-se e constata-se uma evidência: a notoriedade que o desporto permite atingir, seja nacional ou planetária, tem de ser estudada e bem aproveitada pelas empresas, consoante as suas próprias estratégias e os produtos que querem vender. Não pode é ser ignorada. Por mais dispendiosas que estas associações pareçam ser, e muitas vezes parece absurdo pagar tanto dinheiro pelas camisolas de uma equipa, a verdade é que compensa. 400 milhões de pessoas são 400 milhões de pessoas.

Contudo, o desporto também tem os seus contras. Muitas marcas, ao patrocinarem um clube, arriscam-se a provocar sentimentos negativos nos adeptos dos outros clubes, e é por isso que a aposta em eventos culturais é cada vez mais uma alternativa viável. Em Portugal, por exemplo, as operadoras de telemóveis patrocinam os festivais de música de Verão. Existem o “Optimus Alive”, o “Festival Sudoeste TMN” e os concertos Vodafone.

O mecenato cultural não necessita de se limitar a apoiar ópera, e talvez por isso o Banco Comercial Português decidiu ser o patrocinador do “Rock in Rio Lisboa”. Mais uma vez, para além dos efeitos benignos que os consumidores associam às marcas, há aqui um aproveitamento inteligente da notoriedade destes eventos. A cultura também é um fenómeno de massas e portanto um alvo muito apetecível para as empresas.

A CULTURA E OS SEUS INTÉRPRETES

Porque será que George Clooney é o protagonista das campanhas da Nespresso? Porque será que Madonna usa brincos da Bulgari, enquanto canta no intervalo do SuperBowl? Nada disto é inocente, a legitimidade de certos agentes culturais torna-os em líderes de opinião, que as empresas têm de aproveitar para melhor vender os seus produtos.

A grande dificuldade para as empresas, seja no desporto seja na cultura, é definir qual a melhor estratégia para a sua marca, qual o posicionamento que pretendem e quais os efeitos positivos que desejam gerar.

Para certas empresas, um mecenato cultural de alta cultura, que promova o teatro ou apoie uma companhia de ballet, pode fazer mais sentido do que patrocinar uma corrida de motas, mesmo sabendo que a notoriedade da marca será provavelmente menor e a opinião que os consumidores têm dela mais sofisticada.

Porque é George Clooney o protagonista das campanhas da Nespresso? Porque usa Madonna uns brincos da Bulgari, enquanto canta no intervalo do SuperBowl? Os agentes culturais são líderes de opinião

Para outras empresas, associar-se a jogadores de futebol ou a cantoras pop com uma vida desregrada pode não fazer sentido nenhum. Mas se a marca ou o produto em causa forem destinados a jovens urbanos, modernos e “cool”, já pode ser uma ideia de génio.

Cada estratégia depende da marca que se quer ter, do produto que se quer vender, dos objectivos que se pretendem atingir.

O que não faz sentido nenhum é alimentar preconceitos antigos que defendem que a cultura não se deve associar às empresas ou que os criadores de cultura são virgens puras que não devem ser violadas pelo capitalismo. Esses são valores de um mundo passado, que já não existe.

Hoje, vivemos numa época ágil, mutante, onde tudo se passa a grande velocidade, e as empresas que não souberem aproveitar as oportunidades que se geram nos maravilhosos novos mundos do desporto e da cultura só saem a perder.

Domingos Amaral
Jornalista e escritor
Jornalista e escritor. Formado em Economia pela Universidade Católica Portuguesa e com Mestrado em Relações Internacionais na Universidade de Columbia em Nova Iorque, trabalhou em vários jornais, foi sub-director do Independente e director das revistas Maxmen e GQ. Assinou crónicas no Diário de Notícias, Diário Económico, Correio da Manhã e Record. Tem seis romances publicados. @domingos_amaral

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