UNO Dezembro 2013

A comunicação de saúde: do nós ao eles

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A saúde, a falta de saúde, as novidades científicas, as formas em que se organizam as sociedades para oferecer saúde, as possibilidades de saúde dos produtos… são temas que foram se transformando em algo mais que frequentes na comunicação pública. A comunicação de saúde evoluiu para uma superespecialização multidisciplinar no qual interagem outras como a comunicação, a medicina, a ciência, as ciências sociais, a economia, a política, a pedagogia, a sociologia e, inclusive, a psicologia.

O conceito de saúde (com ou sem comunicação) evoluiu no último século do “não estar doente” a conceitos mais positivos. A mais conhecida é a definição da Organização Mundial da Saúde (Preâmbulo da Constituição da OMS, assinada em 22 de julho de 1946 pelos representantes de 61 estados): “A saúde é um estado completo de bem-estar físico, mental e social, e não somente a ausência de afecções e doenças”. Mas em todas elas se pode deduzir que na saúde intervêm diversos fatores.

Cada vez mais, a saúde tem uma importante relação com o acesso que a população tem à informação

O primeiro deles é a biologia humana ou a genética, que não é modificável com ações de comunicação, embora com ela possam ser transferidas informações de interesse que têm a ver com doenças e, sobretudo, com suas curas. Também intervém o sistema de atendimento sanitário existente em um país. A comunicação aqui age no lobby, defendendo ou não os diferentes modelos propostos na sociedade, desde conceitos macroestratégicos a soluções micro. O meio ambiente também influi, não só como a existência ou não de poluição, mas em seu conceito mais amplo: meio ambiente físico, psicológico ou cultural. A comunicação aqui intervém informando ou denunciando. E, por último, o estilo de vida, o grande descobrimento da comunicação em saúde dos últimos anos. Cada vez mais as pessoas estão interessadas em receber informações que as ajude a conseguir hábitos de vida saudáveis, e as empresas entenderam esta necessidade e desejam responder a ela.

Tudo isso nos pode levar a assegurar que, cada vez mais, a saúde tem uma importante relação com o acesso que temos à informação. E neste ponto surgem dois efeitos:

1. A informação de saúde é cada vez mais individual e menos social. Apesar de a comunicação ter se transformado em uma estratégia importante para a política sanitária, a opinião pública está cada vez mais interessada em temas que a afetam de forma individual. Os grandes debates sobre sistemas de atendimento de saúde só interessam se acontecem levando-se em conta os recursos próximos a nós, e as informações sobre estilo de vida devem estar voltadas a modificar atitudes facilmente assumíveis pelo indivíduo, por exemplo.

2. Em todas as enquetes, os temas de saúde estão entre as prioridades de informação da população, mas também em todas as enquetes as pessoas dizem se sentir pouco ou mal informadas.

12Na aparição destes dois paradigmas teve influência de forma notável a evolução da comunicação. Aos dois tipos de imprensa tradicional, o textual e o audiovisual, se uniu a comunicação online. Se em outros âmbitos da sociedade a internet mudou as formas de a população se informar e as formas de empresas e instituições se comunicarem, no caso da saúde se transformou em uma autêntica revolução.

Alguns estudos falam que mais de 50% das pessoas conectadas à internet buscam informações sobre saúde, direta ou indiretamente, e o que é mais importante: que a informação que encontram vai impactar de alguma maneira as decisões que vão tomar. Os cálculos mais conservadores falam em mais de 10 milhões de páginas sobre saúde, às quais é preciso acrescentar a imensidade de aplicações que aparecem a cada dia para tablets e celulares que vão desde perder peso a fazer diagnósticos.

Desejamos nos converter em especialistas de nossas doenças, ainda mais se forem graves. Este é um desejo humano, normal e bom. Queremos ressaltar a palavra bom, porque um cidadão informado, especialmente se informado através da internet, constrói relações entre pessoas interessadas pelos mesmos temas de saúde e se transforma em um paciente independente em caso de doença. A internet torna mais acessível, mais personalizável e mais compartilhável a informação de saúde e a transforma em algo social e emocional.

A internet tornou mais acessível, mais personalizável e mais facilmente compartilhável a informação de saúde e a transforma em algo social e emocional

No entanto, favorece também a figura do “cibercondríaco” (termo cunhado em 2009 por White e Horvitz, pesquisadores da Microsoft). A vasta informação médica que há na Internet pode gerar temores extremos ou ansiedades. De fato, há estudos que mostram que 10 de cada 100 pessoas que buscam informações sobre saúde na Internet terminam ansiosas ou preocupadas (Pew internet Research, 2006). Outro ponto frágil é a falta de proteção na privacidade e na confidencialidade.

A outra característica comumente denunciada é a falta de confiabilidade da informação. Não é certo: grande parte da informação é confiável. O problema reside na falta de mecanismos para diferenciar uma da outra. Os selos de qualidade não se transformaram em diferenciadores, basicamente porque menos da metade das buscas são feitas através de buscadores (Google). Cada vez é maior o acesso à informação de saúde, não através de páginas encontradas no Google, mas em fóruns. E neste cenário é difícil diferenciar as opiniões confiáveis e as que não são.

Só as instituições que forem capazes de mandar mensagens pensando em seu interlocutor e que respondam a suas perguntas serão capazes de encontrar a zona de confluência entre empresa e receptor que gera a credibilidade

E daí se buscamos na Internet? Os resultados variam em função de se realizamos a busca a partir de um computador ou do telefone celular. Segundo o Yahoo!, 3 de cada 5 perguntas que buscamos sobre saúde através do celular têm relação com sexo (gravidez, herpes, doenças de transmissão sexual, etc). As razões: os jovens são os que mais usam os dispositivos telefônicos para acessar a internet, e essas buscas estão ligadas à urgência na necessidade de informação. De forma geral, as palavras mais procuradas têm a ver com herpes, gravidez, depressão, coração e câncer de mama.

A internet representa uma verdadeira revolução na comunicação on e offline de saúde. Não só fez com que a comunicação de saúde se personalize, se individualize, se torne emotiva e facilmente compartilhável, mas lembrou que o foco sempre deve estar em quem lê ou escuta. A internet descobriu que as pessoas não buscamos “tomografia axial computadorizada”, nem “exames radiológicos para o cérebro”, às vezes nem sequer “tumor cerebral” ou “câncer no cérebro”, mas buscamos “dor de cabeça”. Toda esta aprendizagem tem que chegar também à comunicação offline.

Só as empresas que forem capazes de mandar mensagens pensando em seu interlocutor, que respondam a suas perguntas, que ofereçam uma informação pensada nele como pessoa, não só como ser pensante, serão capazes de lhe transferir seus interesses e encontrar essa zona de confluência entre empresa e receptor que gera a tão ansiada credibilidade.

María Cura
Sócia e diretora-geral da LLORENTE & CUENCA Barcelona
Sócia e diretora-geral da LLORENTE & CUENCA Barcelona. Licenciada em Direito pela Universidade de Barcelona, atuou, por quatro anos, como advogada especializada em mercado de capitais. Iniciou sua carreira como profissional de comunicação na Gené&Associados. Mais tarde, se juntou à USP Hospitais, onde foi sócia e membro do Comitê Executivo por nove anos, ocupando o cargo de Diretora Corporativa de Marketing e Comunicação. Em 2009, ingressou na LLORENTE & CUENCA, assessorando clientes como Panasonic, Nissan, Schneider Electric, DKV Seguros, Coca-Cola, L'Oreal, Singapore Airlines, CIRSA, Renta Corporação, Vida Caixa, Fundação MACBA, Fundação Dexeus, Roca & Junyent, entre outros. Aconselhou o Governo de Andorra na crise bancária causada pela intervenção do BPA, bem como no lançamento do UBER na Espanha. María é docente externa no máster da pós-graduação do Departamento de Comunicação da Universidade Pompeu Fabra.

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