UNO Julho 2015

A pergunta de um trilhão

07_2O ano de 2015 será um marco importante para o desenvolvimento a nível mundial. Alguns o comparam com o ano de 2000, quando foram aprovados os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, que expiram justamente este ano. Outros o comparam ao ano de 1945, quando foi criada toda esta galáxia de organizações e conferências cheias de siglas. O fato é que em setembro deste ano serão aprovados os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para 2030, que são mais ambiciosos do que os Objetivos do Milênio – pois incluem não apenas erradicar a pobreza, mas alcançar a igualdade e a dignidade, assim como metas relacionadas à sustentabilidade ambiental. Antes disto, em julho, um novo Marco para o Financiamento do Desenvolvimento será aprovado e, em dezembro, em Paris, são esperados compromissos concretos em matéria de Mudança Climática, durante a COP21.

A UNCTAD, uma das agências das Nações Unidas, vem calculando quanto custam estes objetivos. Ao colocar uma cifra sobre estas aspirações,  por mais tentativas que sejam feitas, surge o fato de que estamos diante de uma mudança de magnitude: o objetivo não pode ser financiado por bilhões1, mas com trilhões de dólares anuais – entre US$ 4 e US$ 7 trilhões -. Como parte do esforço global para fechar essa lacuna vem sendo feito o trabalho de identificar, compreender, documentar e socializar experiências que estejam funcionando. Para fechar esta brecha de financiamento de desenvolvimento existem três fontes principais: a ajuda externa (a partir das agências bilaterais até o Banco Mundial ou o BID), os recursos internos dos países e a mobilização de recursos do setor privado. No caso da América Latina, e o Peru não é exceção, a ajuda externa tem uma pequena participação, porque trata-se de uma região de renda média. A atenção deve estar, então, sobre as outras duas fontes.

Trata-se de tornar realidade as oportunidades de investimento em projetos que visam melhorar a qualidade de vida das pessoas

No caso dos recursos internos, um primeiro elemento importante para a América Latina é que há um espaço significativo para melhorar a arrecadação tributária, pois arrecadamos 15% do PIB, cifra muito baixa para nosso atual nível de renda. Além da arrecadação, é importante trabalhar para a melhoria dos gastos. Aqui, um exemplo interessante é o pagamento de impostos com obras no Peru ou a possibilidade de que o contribuinte escolha, para uma fração de imposto, a que município rural de baixa renda serão destinados seus impostos, como uma forma de premiar os governos mais eficientes, transparentes ou inovadores, como ocorre no Japão. Outro elemento nos recursos internos tem a ver com a melhoria e aprofundamento do mercado de capitais – um caso interessante é o da bolsa de valores no marco da Aliança do Pacífico – e também faz parte disso, a luta contra a lavagem de dinheiro e outras modalidades de fluxos ilícitos de capitais.

Talvez o mais significativo seja o potencial para encurtar a brecha de financiamento em matéria de mobilização de recursos privados. Visto de maneira conjunta, no mundo de hoje há muitíssima poupança e do outro lado da equação há necessidade de investimentos substanciais; mas ainda assim são muito menores do que as economias. Para avançar em direção ao desenvolvimento, e aqui não importa se falamos de um país ou do conjunto de metas de desenvolvimento sustentável da ONU, o foco não pode estar apenas na capacidade dos governos para arrecadar, mas é preciso uma nova abordagem diante do setor privado.

Entre as experiências interessantes estão os “bônus de impacto social”, em que os governos pagam por resultados que permitam alcançar determinados impactos, por exemplo, com economias futuras

07Trata-se de tornar realidade as oportunidades de investimento em projetos que visam melhorar a qualidade de vida das pessoas. Para atrair tais investimentos é necessário contar com mecanismos e incentivos legais adequados. No Peru, vimos, por exemplo, casos interessantes de Parcerias Público-Privadas (PPP), em que um investidor privado assume uma série de riscos em troca da expectativa futura de lucro que justifique os termos. O investidor típico é um operador com experiência no negócio e respaldo financeiro suficiente para assumir riscos e gerir adequadamente dita infraestrutura e isto permite liberar recursos do estado para que este se dedique a outros fins ou garanta mais e novos projetos. Hoje, o desafio é como expandir o apoio financeiro dos operadores privados para atender mais projetos, não apenas de infraestrutura. Dito de outra forma: como vinculamos novos grupos de atores (investidores, savers ou pensionistas, locais ou globais) com as necessidades de financiamento dos países em vias de desenvolvimento?

Entre as experiências interessantes estão os “bônus de impacto social”, em que os governos pagam por resultados que permitam alcançar determinados impactos, por exemplo, com economias futuras. É o caso do financiamento da saúde preventiva através de prestadores privados, que permite economias futuras para uso em caso de doenças raras e típicas das novas classes médias, como diabetes. Isso está acontecendo na África e está sendo financiado pelo governo a partir dos recursos da cooperação internacional. Outro exemplo de bônus de impacto social inovadores é a reabilitação de jovens contra o custo futuro de ter mais detentos na prisão. No caso dos países desenvolvidos, como é o caso dos prisioneiros, estes títulos de impacto social estão permitindo que uma comunidade tenha oportunidades de investimentos interessantes em termos de rentabilidade, que além disso geram um bem social. Uma característica comum dessas inovações é um trabalho bom e sério de mitigação de riscos e regras claras, especialmente nos países em vias de desenvolvimento. Pensando na mitigação de riscos, por exemplo, na África um fundo decidiu financiar um projeto de geração de energia elétrica de 300 megawatts em 20, a fim de efeito de comparação, maior identificação com o “fornecedor local” e para que a infraestrutura não fosse percebida como um monopólio “hostil”. Neste contexto específico, a menor eficiência em termos de escala foi percebida como um menor custo para mitigar os riscos políticos locais específicos. Além disso, uma outra maneira de direcionar o foco para a redução de riscos é mediante garantias e outros veículos financeiros que atendam as necessidades e apetites de risco dos investidores, que, por sua vez, entram em novos esquemas, como o “crowdfunding“, em suas diferentes versões: desde o financiamento coletivo até o micromecenato. Este ano promete nos alcançar mais experiências, boas e más, que nos ajudarão a acelerar o desenvolvimento. E isso já é ganância.

Verónica Zavala
Diretora-Geral do Escritório de Planejamento Estratégico e Efetividade no Desenvolvimento do BID
É Diretora-Geral do Escritório de Planejamento Estratégico e Efetividade no Desenvolvimento do BID. Até junho de 2013, Verónica foi Gerente Geral do Departamento de Países do Grupo Andino. Anteriormente, ocupou o cargo de Gerente setorial para o Setor Público e Unidade do Governo da América Latina e Caribe do Banco Mundial. De 2008 a 2010, foi Diretora-Executiva para Colômbia e Peru no Conselho de Diretores Executivos do BID e para a Corporação Interamericana de Investimentos (CII). Além disso, durante sua carreira no serviço público do Peru, exerceu os cargos de Ministra dos Transportes e Telecomunicações (2006-2008) e de coordenadora do Grupo de Trabalho Presidencial para melhorar a Modernização do Setor Público (2006-2008).

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