UNO Maio 2022

América Latina em um mundo pós-covid

A América Latina foi uma das regiões mais afetadas pela pandemia. Em termos de salubridade, a região acumula o maior número de mortes associados à Covid-19, com o Peru encabeçando a infortunada lista a nível global com uma taxa próxima a 6.400 mortes por milhão de habitantes. Em matéria econômica, a América Latina também foi a região que saiu pior no final ao registrar uma queda da atividade econômica de 6,9% em 2020. As medidas não farmacológicas implementadas para combater a pandemia, como quarentenas e restrições à mobilidade, tiveram um efeito devastador na economia da região caracterizada por uma alta informalidade trabalhista e uma rede de proteção social
insuficiente.

O Chile e a Colômbia alcançaram no final de 2021 níveis de atividade econômica superior aos da pré pandemia em 4,9% e 2,8%, respectivamente.

A região experimentou uma importante recuperação econômica em 2021 em função das campanhas de vacinação em diferentes países que permitiram retomar níveis de atividade similares aos de pré-pandemia em alguns setores. Não obstante, a normalização da atividade econômica dista de ser completa e há uma importante heterogeneidade entre países. O Chile e a Colômbia, por exemplo, alcançaram no final de 2021 níveis de atividade econômica superior aos da pré pandemia em 4,9% e 2,8%, respectivamente. Já o Peru e o Brasil exibem uma taxa de recuperação ligeiramente positiva com uma taxa bianual em 2021 comparada a 2019 de 0,9% e 0,6%, respectivamente. O México, o Peru, a Bolívia e a Argentina todavia se encontram com níveis de produção inferiores aos da pré-pandemia.

Neste contexto, e sob o pressuposto de que a pandemia já iniciou sua transição a endemia, a América Latina enfrenta um número importante de desafios no mundo pós-covid. O mais urgente tem a ver com o aumento acelerado dos preços aos consumidores. De acordo com as pesquisas mais recentes, os analistas econômicos esperam uma inflação para a América Latina de 7,8% para o final deste ano, um aumento significativo frente à cifra de 3,5% pré-pandemia. Esse aumento da inflação, que inicialmente teve origem em um desbalanço entre oferta e demanda global, mas agora se exacerbou pelo conflito bélico na Europa, poderia colocar em risco a recuperação econômica da região e ampliar a pobreza.

Os analistas econômicos esperam uma inflação para a América Latina de 7,8% para o final deste ano, um aumento significativo frente à cifra de 3,5% pré-pandemia

O choque nas matérias primas e energéticas associado ao conflito na Ucrânia está elevando de maneira importante os preços dos alimentos, que são os que mais pesam na cesta básica dos lares mais vulneráveis. A região teve um retrocesso importante na luta contra a pobreza devido à crise econômica em 2021 com um aumento de 30 milhões de pessoas que vivem com baixa renda e uma taxa de pobreza extrema que depois de alcançar níveis mínimos de 8,7% em 2010 retrocedeu a níveis de 13,8%.

O aumento da inflação a nível global e o subsequente aumento de taxas de interesse em muitas jurisdições, gerarão uma pressão adicional nas contas fiscais dos governos da região, que também sofreram um revés importante durante a pandemia devido a maiores necessidades de gasto público e uma menor arrecadação. Com um menor espaço fiscal, os governos da região terão que fortalecer suas receitas tributárias sem afetar a recuperação econômica mediante impostos progressivos, e aproveitar o auge associado aos maiores preços das matérias primas exportadas. Os
maiores preços do petróleo e do cobre podem ajudar a estabilizar as contas fiscais da região e a sustentabilidade dos programas sociais se são aproveitados de maneira eficiente.

A região também deve melhorar seus ajustes institucionais em relação às associações público-privadas para continuar com os programas de investimento público em um contexto de recursos limitados. O caso de sucesso em matéria de associações público-privadas no setor de infraestrutura da Colômbia deve ser um modelo que pode e deve ampliar-se a outras dimensões e países. Isto poderia reduzir os custos logísticos e melhorar a eficiência em matéria de transporte, armazenamento e distribuição de bens. Políticas focadas nesses aspectos podem ser instrumentais para ter ganhos de eficiência que permitam amortecer a pressão inflacionária associada ao maior custo dos insumos, em particular se focarem no setor agrícola.

Na mesma linha, gerar um ambiente regulatório apropriado que incentive a inovação e a transformação digital dever ser uma prioridade no atual contexto para que a região siga melhorando em matéria de inclusão digital e financeira, e, desta maneira, avançar em matéria de aprofundamento financeiro para que as famílias tenham mais ferramentas na hora de suavizar choques adversos a suas receitas como consequência do aumento dos preços aos consumidores.

Finalmente, nesta conjuntura desafiadora, a região deve procurar fortalecer suas redes de proteção social com programas que sejam efetivos na proteção dos mais vulneráveis e, ao mesmo tempo, gerem os incentivos à inserção de tais lares à formalidade mediante uma melhora dos programas de transferências condicionadas que contemplem incentivos à acumulação de capital humano.

José Ignacio López
Diretor-Geral Executivo e Chefe de Pesquisa Econômica em Corficolombiana.
Economista da Universidade de Los Andes, com estudos de mestrado e doutorado da Universidade de California, em Los Ángeles. Trabalhou como economista de ANIF, economista chefe do Banco Santander, Pesquisador visitante do Sistema de Reserva Federal dos Estados Unidos, professor da escola de negócios HEC Paris na França e da Faculdade de Economia da Universidade de Los Andes. É colunista do jornal A República e autor de vários artigos publicados em revistas econômicas especializadas.

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